Eu não sou o Capitão América

ou sobre a importância de nos mostrarmos humanos para outros humanos

Joaquim Mitidiero
3 min readJan 28, 2017

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Eu sempre tive um problema muito sério com demonstrar fraqueza. Não sei bem de onde veio, mas acredito que grande parte disso tem relação com as minhas principais figuras adultas na vida, minha mãe e meu avô. Meu avô é um senhor extremamente correto, organizado, responsável, mas pouco dado a sorrisos e afeto. Minha mãe é uma mulher forte e decidida, que eu vi chorar pela primeira vez quando já tinha trocado todos os meus dentes de leite e que uma vez teve a mão costurada com fio dental porque era o que tinha na fazenda.
Tentei por muito tempo ser a fusão dessas duas pessoas; pegar a garra e expansão da Ana, o metodismo e foco do Luiz e o controle que é bem visível nos dois. Parecia perfeito, praticamente um Capitão América.

Isso começou a se mostrar um problema (se mostrar, não ser. ser já era, mas eu não via) quando eu tive meu primeiro relacionamento sério duradouro. Ou seja, quando comecei a conviver intensamente com uma pessoa que não era da minha família. Nessa relação, comecei a perceber quantas travas para afeto eu tinha, quantos muros para intimidade eu construí e o quanto eu tinha me idealizado ao me moldar tendo como base pessoas que também eram idealizadas. Porque no fim das contas eu não era assim tão certinha e forte, mas convencia muita gente disso. O que não era certinho e forte eu dizia que não era meu, era porque eu tinha bebido um pouco.

Percebi então [depois de algumas brigas, várias seções de terapia e uma crise] que ia ter que mudar a forma como eu lido com vulnerabilidade, com expor meus medos, minhas angústias, meus sentimentos. Um tempo depois encontrei esse TED Talk da Brené Brown, que fala justamente sobre vulnerabilidade, e tive uma explosão mental — "É isso, vulnerabilidade é importante e eu vou adotar pra minha vida". Mas eu e você sabemos que não é assim que se muda todo um padrão de comportamento.

De lá pra cá eu me esforcei pra entender do que era construído o meu muro, me intitulei "engraçadinha pra disfarçar timidez, marrenta pra esconder insegurança" pra, num tom de brincadeira, contar pra pessoas que é mais complexo do que parece. Devo ter assistido esse TED umas 20 vezes e, mais importante, liguei meu radar. Comecei a observar o que eu faço e tentar entender o que de mim eu tô me esforçando para mostrar e o que eu tô fingindo que não existe. Isso mudou a forma como eu me relaciono com minha família, as pessoas que eu gosto, meus colegas de trabalho, meus amigos, meus escoteiros…

*sobre meus escoteiros: se colocar vulnerável foi especialmente importante na relação com eles. Eu lido com jovens de 14 a 17 anos, idade boa pra criar projeções e ideais de figura adulta. Ser uma adulta possível e não idealizada ajuda eles a entenderem que adultos também falham e também choram (coisa que a minha geração só descobriu depois que virou adulta).

É claro que isso ainda é um processo. Eu ainda me escondo atrás de marra e piada, pelo menos hoje eu admito e tento minimizar com o tempo. Cada dia mais eu consigo falar do que me dói, do que me deixa triste, do que eu tenho medo, do que eu queria poder controlar mas não consigo.
Sigo tentando.

É possível que esse texto tenha ficado desconexo e ruim enquanto narrativa, mas resolvi que vou postar sem editar. Se eu ler de novo ele agora vou começar a mascarar esse fluxo de pensamento até me deixar parecendo mais forte. Decidi escrever ele por causa de uma frase que ouvi da Jéssica Tauane dia desses num vídeo, e acho que é só ela que eu queria compartilhar com as pessoas no fim das contas. Mas me vi com necessidade de contextualizar. Enfim, só o que eu queria dizer mesmo é isso aqui:

"Falem sobre as vulnerabilidades de vocês porque isso deixa outras pessoas mais fortes."

Porque no fim das contas o Capitão América é um saco.

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